quinta-feira, 11 de julho de 2013

Fé é a força inversa ao medo


 
 

Nada a temer. Senão o correr da luta.

Nada a fazer senão esquecer o medo.

Abrir o peito à força. Numa procura.

Milton Nascimento

 

Fé é a força inversa ao medo, é a frase pintada em uma pequena tabuleta que de cima de minha mesa rouba o olhar de quem busca refúgio para suas dores em minha sala. Ter fé é não ter medo de confiar a luta a Deus. Para o pai que chora a morte da filha Jesus recomenda: “Não tenha medo; tenha fé!” (Marcos 5.36). Confiando, Davi enfrentou Golias. Confiando, Maria disse “sim” ao anjo Gabriel quando ele lhe anunciou a gravidez (Lucas 1.26-38). Maria teve medo, sabia que era impossível, afinal não havia tido relações com homem nenhum. Mas, acima de tudo, confiou: “Não tenha medo, Maria! Deus está contente com você” (v. 30). Maria responde confiante: “Eu sou uma serva de Deus; que aconteça comigo o que o Senhor acabou de me dizer!” (v. 38).
Diferente foi quando o mesmo anjo Gabriel apareceu para Zacarias, também anunciando o nascimento de uma criança. Zacarias viu o anjo e ficou com medo (Lucas 1.5-25). Diz o texto que ele não sabia nem o que dizer diante da aparição do anjo. Contra o anúncio do anjo, Zacarias tinha a sua idade avançada. Sua esposa também já era idosa. O anjo pediu que não tivesse medo: “Não tenha medo, Zacarias, pois Deus ouviu sua oração!” (v. 13).
Maria confiou mais no anjo do que na impossibilidade. Zacarias confiou na impossibilidade. Não havia palavra que descrevesse seu espanto diante daquela notícia. Não tinha palavras. Ficou mudo. Quando nasceu seu filho João – que mais tarde se tornaria João Batista –, as palavras voltaram a borbulhar da boca de Zacarias. E quem disse que também não temos nossos momentos “ver para crer”? Algumas vezes, somos assim meio Zacarias, meio Tomé.
E José, o noivo de Maria? Esse, então, teve que ter confiança em Deus e uma profunda confiança em seu amor por Maria, para que não fizesse uma loucura. Ele confiou e aceitou Maria, apesar de tudo. Que ventos benfazejos não sopraram naquela manhã em que José acordou de seu sonho e disse a Maria que casaria com ela. Ora, estava grávida e não era dele o filho, era uma situação constrangedora para o pobre homem. José saltou no desconhecido, foi uma escolha feita por amor. Amor é também um ato de fé no outro. Fé é isto: uma prova de que existem coisas que não podemos ver (Hebreus 11.1-2).O indiano Rabindranath Tagore poetiza: “Fé é pássaro que canta quando a noite ainda está escura”. Nas palavras da médica e psicanalista francesa Françoise Dolto, fé “é viver cada dia, cada provação, cada alegria e toda a minha vida. É também aceitar a realidade que a anima, ainda que eu não a conheça e não possa saber o que ela me trará. É, portanto, viver na realidade e agir”. Martim Lutero acredita que fé seja, sobretudo, confiança na bondade e misericórdia de Deus – a confiança que podemos depositar no Criador.
Fé é confiança na possibilidade do impossível. É confiança no Absolutamente Outro. Fé é sentir-se dependente, desde as entranhas, unicamente de Deus.
Ao dizer “tua fé te salvou”, Jesus parece estar convocando para uma confiança sem reservas. Em algumas das curas, como a da filha de Jairo, ele convida para estar com ele somente aquelas pessoas que desejavam o impossível – a cura diante da morte (Marcos 5.21-42) e os discípulos mais chegados.
(texto de Vera Cristina Weissheimer)