sábado, 20 de outubro de 2012

A solidão no Getsêmani

Alguns pacientes tentam ter uma conversa séria sobre seu estado de saúde, suas angústias existenciais, seu sofrimento, sua dor, seu medo do que há de vir e sua solidão naquela cama de hospital. Mas na maioria dos casos, as tentativas por uma conversa caem no vazio. Nem equipe médica, nem família conseguem realmente ouvi-lo. A família, apavorada, tenta esconder sua tristeza e escamotear o sofrimento dizendo: “Você vai ficar bom!” Mas o paciente sabe que, muito provavelmente, não ficará “bom”.

A pessoa doente, quando o médico não lhe conta, parece receber sinais do próprio corpo ou de algum anjo que Deus envia para lhe adiantar que é chegada a hora, como o profeta Isaías foi encarregado de avisar o rei Ezequias. E ciente de sua condição e querendo poupar a quem ama e não ser o causador de mais preocupações, pede com voz firme: “Poupe minha família, doutor, eu sei que meu estado de saúde é delicado, e que posso morrer. Não conte a eles a verdade.” Assim cada um – família e doente – se enclausura em sua solidão particular. Começa, então, um dolorido faz de conta.

O doente quer e precisa uma companhia verdadeira da mesma forma que Jesus, quando sentiu que sua morte estava próxima, não quis ficar só, pediu a seus discípulos que fossem com ele a um lugar chamado Getsêmani: “Venham comigo. Enquanto eu vou ali orar.” Levando consigo três de seus discípulos foi até o lugar onde queria silenciar e fazer a sua oração. “Aí ele começou a sentir uma grande tristeza e aflição e disse a eles: A tristeza que estou sentindo é tão grande, que é capaz de me matar. Fiquem aqui vigiando comigo. Ele foi um pouco mais adiante, ajoelhou-se, encostou o rosto no chão e orou: Meu Pai, se é possível, afaste de mim este cálice de sofrimento!”; de vinho tinto de sangue, como canta Chico Buarque em “Cálice”. Deixamos nosso doente sozinho em seu Getsêmani, porque também a nós a tristeza está matando e não conseguimos ficar vigilantes porque estamos cansados e a verdade, nesses casos, pode ser dura demais para ser suportada, crua de mais para ser digerida.

(Vera Cristina Weissheimer)

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