sexta-feira, 4 de junho de 2010

O rasgo

(texto de Vera Weissheimer)
Glorinha chega para a sua primeira sessão de análise. O analista, uma indicação de uma amiga, abre a porta e num sorriso a convida para entrar na sala. Aquele sotaque castelhano era encantador, a cabeleira branca cuidadosamente desalinhada, sempre com aparência de desleixo, mas era puro charme.
Ela entra na sala olha para a poltrona e depois olha para o divã. Não teve dúvidas. Foi até o divã e, então, deitou-se como se sempre tivesse feito aquilo. Olha para o teto e vê um risco que se transforma num rasgo na parede. Uma criatura rasgada, é assim que se sente. Ah! Ela queria encontrar esse rasgo para poder entrar em si mesma e descobrir de onde vinha tanta dor. Enquanto olhava o rasgo na parede pensou que, talvez ensimesmada signifique isso, estar em si mesma, entrar dentro de si mesma. Não falou nada. Descobrira que o silêncio era bom. Não quis falar nada. Não falou nada.

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