sexta-feira, 4 de junho de 2010

Solidão

(texto de Vera Weissheimer)
Ouço a solidão caminhar pela casa. Ela vai abrindo as portas de todos os cômodos. Abre-as uma a uma. Agora já a sinto perto de mim. Mas eu continuarei espantando-a de todas as formas, tomo um copo de água, depois um vinho. Luto com meus pensamentos para que não me abandonem. Estão batendo na porta. Não vou abrir, deve ser ela que anda pela casa com passos firmes e largos espalhando seu cheiro ocre por todos os cantos. A noite já se entrega à madrugada e ainda estou aqui lutando para não ser tomada pelo horror de estar só.
Quando se quer ficar sozinho, escutar uma boa música, tomar um vinho tinto fechando os olhos para reter o cheiro da pessoa amada é uma opção maravilhosa. E, pensando bem, não se está só em momentos assim. Estamos com a outra parte de nós que só conhecemos quando nos entregamos a um apaixonado flerte com o que somos de verdade.
Por outro lado, quando somos surpreendidos com alguém fechando a porta. Alguém entregando a cópia da chave do apartamento que até ali era plural e, dali por diante, será singular apenas, é dor aguda. Dá vontade de afundar a cara no travesseiro e dar o maior grito que os pulmões tiverem fôlego para dar. Merecemos gritar de vez em quando. (Mas também merecemos rir. Sempre!)
Gritar no carro, no banheiro, no travesseiro isso nos recompõe nos salva quando estamos sendo assassinados por nossas banalidades ou por nossas paixões que julgávamos ser amor. O grito exorciza os pulmões, sacode a poeira do cérebro.
Permita-se desembarcar do certo e do programado, daquilo que sempre pensou ser o certo, daquilo que sempre ouviu dizer que era o melhor. Há momentos em que desembarcar é o mais acertado.
E, quando ouvir a solidão rondando a sua vida e bater em sua porta dê um grito bem alto e a afugente. Porque solidão só é boa quando nela podemos marcar um encontro íntimo com nós mesmos.

2 comentários:

Grande Encontro disse...
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Grande Encontro disse...

Existe uma outra abordagem da solidão que reconheço como das mais terríveis, aquela solidão que a gente jura que não merecia, aquela solidão que costuma convidar a tristesa para seu chá das 5.Certa vez escrevi sobre mim mesmo o seguinte:” Os tempos se passaram e o menino encantado
Descobriu que a poesia também pode trazer dor,
Inquietude, ansiedade.
E alterar o metabolismo do frágil organismo apaixonado
O menino conheceu os longos monólogos da tristeza
E entre um vinho seco e outros tantos e amargos aguardentes
Procurou se esconder da incomoda visita
Dos fantasmas assustadores, originados pelo mau da solidão.”
Obrigado Vera, por me fazer lembrar que a solidão pode ser uma boa parceira.